Odontologia - 29.09.2025
Dia Mundial do Coração: o papel do Cirurgião-Dentista na prevenção cardiovascular
Integração entre Medicina e Odontologia reforça a importância da anamnese, da prevenção e da preparação para emergências no consultório odontológico

As doenças cardiovasculares são a principal causa de morte no Brasil, responsáveis por cerca de 400 mil óbitos anuais — uma vida perdida a cada 90 segundos, segundo a Sociedade Brasileira de Cardiologia. Dados do Ministério da Saúde indicam que essas enfermidades representam 30% de todas as mortes no país, com maior prevalência em pessoas acima de 65 anos (72,7% dos óbitos) e entre a população com menor escolaridade (63,8% dos casos em indivíduos com até 7 anos de estudo).
Nesse cenário, a prevenção é a principal estratégia. O cardiologista Luís Henrique Gowdak, coordenador de Gestão Assistencial da Unidade de Aterosclerose e Coronariopatia Crônica do InCor-HCFMUSP, lembra que grande parte dessas mortes poderia ser evitada com mudanças no estilo de vida, acompanhamento regular e tratamento adequado dos fatores de risco. Ele explica que o acúmulo de gordura nas artérias pode levar ao rompimento de placas e à formação de coágulos que bloqueiam o fluxo sanguíneo, resultando em infarto — motivo pelo qual exames periódicos são indispensáveis.
Ao lado da medicina, a Odontologia também exerce papel fundamental na prevenção. No Dia Mundial do Coração, a Associação Paulista de Cirurgiões-Dentistas (APCD) destaca a importância do Cirurgião-Dentista na identificação precoce de riscos cardiovasculares e na condução segura do atendimento odontológico.
A anamnese como ferramenta de prevenção
O professor titular do Departamento de Cirurgia, Estomatologia, Patologia e Radiologia da Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de São Paulo (FOB-USP) e diretor Científico do Departamento da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (SOCESP), Dr. Paulo Sérgio da Silva Santos ressalta que a anamnese é um recurso essencial nesse processo.
“A anamnese significa trazer de novo à memória do paciente sobre seu histórico médico e odontológico. Dentro deste cenário, algumas perguntas são fundamentais para a identificação de riscos cardiovasculares previamente à realização de procedimentos odontológicos”, explica.
Entre os pontos que não podem faltar, ele destaca:
- episódios de hemorragias e uso de anticoagulantes;
- antecedentes de febre reumática ou endocardite;
- histórico de doenças cardiovasculares ou hipertensão;
- desmaios ou perda de consciência;
- uso de medicações e internações recentes.
“Às vezes, mesmo com as perguntas diretas o paciente não relata a doença, mas com estas perguntas se consegue rastrear e relembrar se há alguma condição cardiovascular para a segurança do paciente e do profissional”, acrescenta.
Preparação para emergências
De acordo com o Dr. Paulo Sérgio, a anamnese minuciosa associada a medidas de controle de estresse e ansiedade é a principal forma de prevenir a ocorrência de eventos cardíacos no consultório odontológico.
“Havendo uma crise cardíaca no consultório, o conhecimento dos principais sinais e sintomas é fundamental no diagnóstico diferencial de cardiopatias agudas e, após estabelecido este diagnóstico, devem-se iniciar os primeiros socorros básicos através do acionamento do serviço de emergência, seguido pelo posicionamento corporal adequado do paciente e administração dos protocolos farmacológicos específicos para cada situação”, orienta.
Ele acrescenta que o consultório odontológico deve obrigatoriamente possuir equipamentos para monitorização dos sinais vitais durante um evento cardiovascular agudo e garantir a disponibilização de oxigênio. “Assim, o Cirurgião-Dentista pode iniciar os protocolos de ressuscitação caso o paciente evolua para uma parada cardiorrespiratória.”
“O manejo odontológico das emergências cardiovasculares agudas inicia-se com cuidados preventivos específicos, realização do diagnóstico correto da cardiopatia aguda e tomada de conduta adequada das complicações que possam ocorrer durante o tratamento odontológico, para reduzir a morbimortalidade dessas situações”, conclui.
Recomendações práticas para o consultório
Além da anamnese detalhada, algumas medidas simples aumentam a segurança do atendimento odontológico:
- aferir pressão arterial e frequência cardíaca em todas as consultas;
- monitorar pacientes em procedimentos invasivos antes, durante e após;
- manter comunicação com o cardiologista quando necessário;
- aguardar estabilização médica em casos de infarto recente;
- usar anestésicos com vasoconstritores de forma criteriosa;
- preferir consultas breves para minimizar o estresse;
- considerar sedação complementar em situações selecionadas.
Capacitação profissional
Pesquisas mostram que 61% dos Cirurgiões-Dentistas já vivenciaram alguma emergência médica em seus consultórios, sendo a lipotímia a mais comum (31,6%). No entanto, apenas 47,4% se consideram preparados para diagnosticar uma emergência cardiovascular.
Por isso, a capacitação em Suporte Básico de Vida e a atualização constante em protocolos de emergência são fundamentais para garantir a segurança do paciente e a tranquilidade do profissional.
O consultório como espaço de prevenção
O consultório odontológico também é um espaço de prevenção cardiovascular. O Cirurgião-Dentista, ao realizar uma anamnese detalhada, tratar adequadamente as doenças bucais e estar preparado para emergências, contribui para reduzir riscos e salvar vidas.
A boca é porta de entrada não apenas para a saúde, mas também para a doença. Com conhecimento adequado e prática consciente, o profissional de Odontologia torna-se um agente fundamental na prevenção e identificação precoce de riscos cardiovasculares.
Números da realidade brasileira
- 400 mil mortes anuais por doenças cardiovasculares (Sociedade Brasileira de Cardiologia)
- 45% das doenças cardíacas e 36% das mortes por problemas cardíacos têm origem bucal (Instituto do Coração – InCor)
- 30% de todas as mortes no Brasil estão relacionadas a doenças cardiovasculares (Ministério da Saúde)
- 1 morte a cada 90 segundos no país (Sociedade Brasileira de Cardiologia)
- 80% dos casos são evitáveis com prevenção (Organização Mundial da Saúde)
Por Swellyn França